O hip-hop português chega às grandes salas

 

O título pode soar um pouco a totobola à segunda-feira. Afinal, já não é novidade que após décadas de picareta, o hip-hop conquistou por fim o mercado português, obrigando editoras, agentes, promotores e meios de comunicação a aceitar e aplaudir. Com algum atraso, face à expressão conquistada por alguns fenómenos em (sub)mundos nem sempre visíveis, mas talvez a grande conquista seja essa: projectar a invisibilidade e dar-lhe um lugar ruídoso da fala constituído por versos, estrofes e engenharia instrumental. Nos últimos anos, gente como Wet Bed Gang, Plutónio, T-Rex, Slow J, Nenny, Dillaz, Chico da Tina e Piruka está entre os mais ouvidos em streaming e tem alguns dos vídeos mais assistidos no YouTube.

 

Portanto, assunto arrumado quanto à expressão do hip-hop português. Mas nem sempre o impacto se tem amplificado em palco. Desde logo, e é importante sublinhar este argumento, porque, à semelhança do que sucede em muito do rap americano, o estúdio é a primeira habitação. E só depois vem o palco, quando vem. Por isso, nem sempre a popularidade entre a música “ouvista” se traduz em concertos, salas ou digressōes. Depende.

 

Um mês com concertos nos coliseus de T-Rex (esgotado) e Valete (vinte anos de carreira); e de Wet Bed Gang no Campo Pequeno e Super Bock Arena ainda é notícia, sim. E representa uma afirmação total e plena do hip-hop português em todas as dimensōes, do estúdio ao palco, passando por vídeos, plataformas, redes sociais e festivais. Algo só possível pelas repercussōes do hip-hop. Cor D’Água, o álbum de estreia de T-Rex, bateu o recorde de mais ouvido num só dia no Spotify, sucedendo a You’re Forgiven, de Slow J – curiosamente, convidado quer do disco, quer do concerto de T-Rex no Coliseu dos Recreios.

 

É verdade que não estamos a falar de ineditismo. Vários foram os rappers portugueses a sentir o piso de salas como o Coliseu, de Boss AC, em 2006, a Slow J, no Vodafone Mexefest, a Plutónio, Profjam, ou Sam The Kid, aquando do regresso aos palcos. A novidade está na sucessão de datas e normalização do(s) acontecimento(s).

 

E há mais. Esta sexta-feira, Sam The Kid tomou conta do Lux e liderou uma curadoria da TV Chelas com concertos de Mãodobra (dupla com o DJ Nel’Assassin), Classe Crua (com Beware Jack) e Vludo (com Blasph) – estes que acabam de estrear Dedos Finos; e DJ sets de Nel’Assassin, Maddruga e Kronic. Dentro de um mês, Prodígio sobe ao palco do Hard Club a 25 de março, e a 1 de abril no Capitólio. E os festivais já não têm como sinalizar o caso se não com luzes de presença…